Fim das infecções? Cientistas de Stanford criam primeiro vírus do mundo desenvolvido por IA
Objetivo do estudo é mostrar o potencial da tecnologia como ferramenta para combater doenças infecciosas; próximo passo é desenvolver novas formas de vida, segundo os pesquisadores
Pesquisadores da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, anunciaram a criação do primeiro vírus do mundo desenvolvido por inteligência artificial (IA), capaz de caçar e destruir cepas da Escherichia coli, bactéria naturalmente encontrada no intestino e responsável por diversas infecções, como gastroenterite e infecção urinária.
O estudo, liderado pelos biólogos computacionais Brian Hie e Samuel King, foi divulgado na quarta-feira (17) no repertório científico aberto bioRxiv, mas ainda não passou por revisão por pares.
Segundo os autores, esta é a primeira vez que sistemas de IA conseguem escrever sequências genômicas em escala completa. Para isso, foram utilizados os modelos Evo 1 e Evo 2, treinados com mais de 2 milhões de genomas de bacteriófagos (vírus que infectam bactérias para se reproduzir).
A partir do vírus ΦX174 — que infecta bactérias e possui um genoma relativamente simples — a IA gerou milhares de novas sequências capazes de atacar cepas de E. coli, inclusive resistentes a antibióticos.
O objetivo da pesquisa é mostrar o potencial da IA como ferramenta para combater infecções baterianas. Dos 302 vírus sintetizados em laboratório, 16 mostraram capacidade de infectar e matar diferentes linhagens da bactéria, algo que o vírus original não conseguia fazer.
Para os cientistas, a técnica abre caminho para novas terapias contra infecções bacterianas resistentes. “Esperamos que uma estratégia como essa possa complementar as abordagens atuais de fagoterapia e, no futuro, ampliar o arsenal contra patógenos preocupantes”, afirmou Hie, em artigo publicado na Nature.
"Foi um resultado bastante surpreendente e muito animador para nós, pois mostra que esse método pode ser potencialmente muito útil para fins terapêuticos", afirma King, colega de Hie.
O próximo passo da pesquisa é desenvolver novas formas de vida,segundo os pesquisadores.

O cientista de Stanford Brian Hie — Foto: Divulgação
Cuidados e riscos da pesquisa
A comunidade científica alerta para os cuidados que a pesquisa exige. Peter Koo, biólogo computacional do Laboratório Cold Spring Harbor, em Laurel Hollow, Nova York, ressalta que o modelo Evo, sozinho, ainda não é suficiente para projetar e gerar vírus sem a intervenção, orientação e filtragem da equipe.
“Mas acredito que, como sistema geral, com todos os filtros em vigor e todo o pipeline que eles montaram, o estudo mostra que essa pode ser uma abordagem capaz de levar a genomas funcionais”, explica.
Há preocupações éticas sobre o uso da inteligência artificial para criar vírus que possam prejudicar humanos. Mas, segundo Kerstin Göpfrich, biofísica e bióloga sintética da Universidade de Heidelberg, na Alemanha, esse problema — conhecido como dilema de uso duplo (dual-use dilemma) — não é exclusivo da IA, mas sempre presente na biologia.
“Acho que, em pesquisa, em geral, sempre existe o dilema do uso duplo. Não há nada de específico na IA: qualquer avanço pode ser usado para o bem ou para o mal”, afirma.
Os pesquisadores esperam que a abordagem do estudo possa ser usada de forma segura para gerar vírus projetados por IA com potencial de tratar diversas doenças e problemas de saúde pública, incluindo o crescente desafio da resistência bacteriana.
“Eu acredito que este será, sem dúvida, um campo em expansão e estou muito empolgada com isso”, conclui Göpfrich.
Fonte: Epoca Negócios
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